terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Crônica (O prêmio)


 
“É o visitante 100.001. Parabéns. Nosso gerador numérico selecionou você como um possível ganhador de uma...”.

Na tela em letras coloridas e garrafais, o anúncio tendo como pano de fundo a imagem aérea de Paradise City, pequena e bucólica cidade incrustada às margens do famoso e turístico lago de mesmo nome, em língua pátria.

A menina, na espontaneidade de seus dez anos, largando o notebook cor de rosa aberto sobre a cama ainda desfeita, num salto fica em pé e sai proclamando pelo interior da casa localizada na Vila dos Anjos, abastado bairro de classe média e novíssimos moradores da localidade mencionada (tosse, tosse).

 - Ganhei uma cidade, ganhei uma cidade.

Primeiramente passa pela porta do quarto do primogênito, sentado em frente ao computador.

- Ganhei uma cidade, ganhei uma cidade.

Ele, na indolência de seus treze anos, parece não perceber sua presença e muito menos ouvi-la, pois não desprega os olhos da tela e sequer mexe as orelhas (?). E de pouco adiantaria se percebesse ou ouvisse, pois ela não está mais ali e nem aí, continuando em sua peregrinação.

- Ganhei uma cidade, ganhei uma cidade.

O homem trajado todo de branco, confortavelmente acomodado na poltrona de couro marrom, dá uma olhadela para a menina que saltitante cruza pela sala, retornando sua atenção, circunspeto como sempre, para a extensa petição em seu colo.

- Ganhei uma cidade, ganhei uma cidade.

A pequena mulher que, auxiliada por sua bela funcionária, está perfilando oito homenzinhos de latão e uma só mocinha de lata em seus respectivos assentos na mesinha de brinquedo sobre a mesa de madeira de lei onde dali a instantes será servida a lauta refeição aos convivas, fica a contemplar o bailado inocente da menina até que atravesse a copa/cozinha em direção da porta, alcançando o higienizado quintal com seu piso de cinco cores.

- Ganhei uma cidade, ganhei uma cidade.

De sua casinha de tijolos a vista com telhado oriental e piso de cimento queimado, o cão labrador por nome Divino observa com certa curiosidade aquele bailar. Deixando o saboroso osso de lado, decide participar por alguns minutos da lúdica farra.

- Ganhei uma cidade, ganhei uma cidade - a menina canta, demonstrando toda sua alegria por ter companhia.

Divino, faceiro e saltitante, late ao seu redor ao mesmo tempo tentando morder o próprio rabo.

Afe.
 
(João Neto)

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