- “Rapaiz do céu”, é o dia, é o dia.
O moço todo esbaforido senta no banquinho de madeira ao lado do amigo e
companheiro de trabalho, respirando fundo e tomando fôlego.
- Emenengarda, manda uma “gelada” – ele pede à fogosa balconista.
Emenengarda faz sinal de positivo, e, lépida e faceira, segundos depois
está depositando o litrão estupidamente gelado no banquinho entre os dois
jovens, recolhendo a garrafa vazia, deixando-os à vontade.
- Obrigado – agradece o rapaz, com o fôlego retomado, enchendo seu copo
e do amigo. Depois de brindarem, os esvaziam num gole só, colocando-os ao lado
da litrão, enquanto olham o movimento de carros e pessoas pelas calçadas e rua
da região central da pequena e bucólica cidade.
Emenengarda, atrás do balcão, observa-os, curiosa.
- “Rapaiz do céu”, é o dia, é o dia.
Vai entender. Dia ensolarado, três horas da tarde de uma quinta-feira, mês
de fevereiro do milionésimo décimo terceiro ano do Senhor, ambos de férias,
sentados em banquinhos de madeira, defronte ao bar mais conhecido e frequentado
da cidade. Ará sô, o que haveria de perturbar tão aprazível momento?
Com o copo novamente cheio na mão, os jovens permanecem em silêncio, na
contemplação etílica daquele cenário tão interiorano.
- “Rapaiz do céu”, é o dia, é o dia – a ladainha interrompe a paz que se
faz presente.
Prazerosamente o outro jovem continua sorvendo o líquido amarelo,
aparentando não dar muita importância ao som semelhante coinchar do seu lado.
Emenengarda surge do interior do bar trazendo um pratinho de plástico
com porção de mandioca frita e outro litrão.
- Tá nervoso? – pergunta descaradamente ao jovem.
- Tô não – responde ele,
aparentando surpreso - Qual o motivo da pergunta?
- Ora, fica aí repetindo “é o dia, é o dia”.
- Pois é o dia, “rapaiz do céu”.
Emenengarda sorri graciosamente. Está acostumada em ser chamada assim
por ele, aliás, que trata quem quer que seja dessa maneira.
- E...?
- Você acreditaria que daqui algumas horas a corvina beliscará a isca? “Rapaiz
do céu”, é o dia, é o dia, a pescaria promete, a pescaria promete.
Emenengarda discretamente balança a cabeça da esquerda para direita e da
direita para a esquerda enquanto retorna ao interior do estabelecimento,
levando a garrafa vazia numa das mãos.
“E eu lá quero saber de pescaria”, pensa com seus botões.
Os dois jovens dividem o último pedaço de mandioca frita, enquanto
contemplam os carros e pessoas transitando num número cada vez maior.
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