quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Crônica (Férias e pescaria)



- “Rapaiz do céu”, é o dia, é o dia.

O moço todo esbaforido senta no banquinho de madeira ao lado do amigo e companheiro de trabalho, respirando fundo e tomando fôlego.

- Emenengarda, manda uma “gelada” – ele pede à fogosa balconista.

Emenengarda faz sinal de positivo, e, lépida e faceira, segundos depois está depositando o litrão estupidamente gelado no banquinho entre os dois jovens, recolhendo a garrafa vazia, deixando-os à vontade.

- Obrigado – agradece o rapaz, com o fôlego retomado, enchendo seu copo e do amigo. Depois de brindarem, os esvaziam num gole só, colocando-os ao lado da litrão, enquanto olham o movimento de carros e pessoas pelas calçadas e rua da região central da pequena e bucólica cidade.

Emenengarda, atrás do balcão, observa-os, curiosa.

- “Rapaiz do céu”, é o dia, é o dia.

Vai entender. Dia ensolarado, três horas da tarde de uma quinta-feira, mês de fevereiro do milionésimo décimo terceiro ano do Senhor, ambos de férias, sentados em banquinhos de madeira, defronte ao bar mais conhecido e frequentado da cidade. Ará sô, o que haveria de perturbar tão aprazível momento?

Com o copo novamente cheio na mão, os jovens permanecem em silêncio, na contemplação etílica daquele cenário tão interiorano.

- “Rapaiz do céu”, é o dia, é o dia – a ladainha interrompe a paz que se faz presente.

Prazerosamente o outro jovem continua sorvendo o líquido amarelo, aparentando não dar muita importância ao som semelhante coinchar do seu lado.

Emenengarda surge do interior do bar trazendo um pratinho de plástico com porção de mandioca frita e outro litrão.

- Tá nervoso? – pergunta descaradamente ao jovem.

 - Tô não – responde ele, aparentando surpreso - Qual o motivo da pergunta?

- Ora, fica aí repetindo “é o dia, é o dia”.

- Pois é o dia, “rapaiz do céu”.

Emenengarda sorri graciosamente. Está acostumada em ser chamada assim por ele, aliás, que trata quem quer que seja dessa maneira.

- E...?

- Você acreditaria que daqui algumas horas a corvina beliscará a isca? “Rapaiz do céu”, é o dia, é o dia, a pescaria promete, a pescaria promete.

Emenengarda discretamente balança a cabeça da esquerda para direita e da direita para a esquerda enquanto retorna ao interior do estabelecimento, levando a garrafa vazia numa das mãos.

“E eu lá quero saber de pescaria”, pensa com seus botões.

Os dois jovens dividem o último pedaço de mandioca frita, enquanto contemplam os carros e pessoas transitando num número cada vez maior.
 
 
(João Neto)

 

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