domingo, 31 de março de 2013

Eu só peço a Deus


Eu só peço a Deus
Que a dor não me seja indiferente
Que a morte não me encontre um dia
Solitário sem ter feito o que eu queria
 
Eu só peço a Deus
Que a dor não me seja indiferente
Que a morte não me encontre um dia
Solitário sem ter feito o que eu queria
 
Eu só peço a Deus
Que a injustiça não me seja indiferente
Pois não posso dar a outra face
Se já fui machucada brutalmente
 
Eu só peço a Deus
Que a guerra não me seja indiferente
É um monstro grande e pisa forte
Toda fome e inocência dessa gente

Eu só peço a Deus
Que a mentira não me seja indiferente
Se um só traidor tem mais poder que um povo
Que este povo não esqueça facilmente

Eu só peço a Deus
Que o futuro não me seja indiferente
Sem ter que fugir desenganando
Pra viver uma cultura diferente

Salve Beth Carvalho,
Salve Mercedes Sosa
(música: Eu só peço a Deus)

Eu só peço a Deus que a cidadania não me seja indiferente, que a justiça não me seja indiferente, que a verdade não me seja indiferente, que o presente não me seja indiferente.
Eu só peço a Deus que solidão esteja apenas em meus versos, que a dor seja pela ausência momentânea, que a morte seja a porta de um novo caminhar.
Eu só peço a Deus que os envolvidos na guerra pessoal por divergências politícas se conscientizem que o povo percebe a falcatrua de guerrearem egoisticamente.  
Eu só peço a Deus que eu realize aquilo que me seja competente, que a mentira seja desmascarada frequentemente, que a violência intelectual e a indiferença social sejam banidas pra sempre, que a inocência coerente e a pureza consciente pertençam pra toda gente.
Eu só peço a Deus que eu não viva numa cultura diferente, e sinta orgulho em qualquer canto e lugar por ser itaiense.
 
(João Neto)

sábado, 30 de março de 2013

Poesia (Essência)


Na asa-delta a planar
Toca o teto do mundo
Num nanossegundo
Pousa sobre as águas
Onde caminha sem percalço

Num salto está na mais alta montanha
De cócoras lá do alto
Contempla a natureza imensa
Que placidamente se apresenta

No instante seguinte
Entre os canteiros do Éden
Desenha estrelas e constelações
Na pétala da flor de jabuticaba
Cantarolando celestes canções
Na companhia de beija-flores e pirilampos

Ao limiar do tempo que nunca acaba
Na maciez do mais belo dos arranjos
Adormece com os anjos

Espírito altivo

Ao amanhecer a  luz resplandece
Trazendo em sua essência uma prece

(Joao Neto)

sexta-feira, 29 de março de 2013

Crônica (E assim terminou...)


Jamais alguém imaginaria que terminaria assim.
De imediato, esclareço que Amélia não frequenta mais a reunião da mocidade. Há algum tempo não a vemos, e as últimas notícias sobre ela dão conta que foi seduzida pelas coisas do mundo.  Toda sedução é uma ilusão, favo sem mel. Mas tenho comigo que logo, logo, estará de volta.
Antonio, meu primo, agora é músico, faz parte da orquestra de nossa igreja. Namora firme com Cleuza.  Esse namoro vai acabar em casamento. Espero que sejamos convidados para padrinhos, afinal fomos os primeiros a incentivar essa relação. Eu e minha amada Berenice.
Alias, estamos de casamento marcado. Terceiro sábado de agosto. Eles ainda não sabem, mas Antonio será meu padrinho e Cleuza madrinha da noiva.
Corte rápido.
- E o guri sentado como Buda?
- Apesar dessa sua descrença, digo e repito, eu vi.
Godofredo começa a rir.
- Ri. Quando acontecer contigo, aí não me venha com chorumela.
Godofredo desenfreia o riso.
Ele e Hermenegildo estão sentados no banco preferido da praça da matriz da pequena e bucólica cidade interiorana, aguardando o ônibus circular. Resolveram passear pela cidade naquele veículo, até porque é grátis.
- Mas pode! Compadre, hoje é feriado, não tem circular.
- É não é mesmo.
Surge, vindo lá dos lados da avenida, Berenice e aquele rapazinho baixinho e magérrimo, desconhecido pelos dois compadres, caminhando de mãos dadas.
- E lá vem ela... – troça Godofredo.
- Deus do céu! Deus do céu!
- Casalzinho bonito – elogia Godofredo.
- Boa tarde – Berenice os cumprimenta com seu jeito monossílabo, mas os olhos denunciando a felicidade que traz no coração.
- Menina, por favor – chama Godofredo.
- Sim – Berenice atende ao chamado, parando em frente aos dois velhotes, o namorado ao lado, em silêncio.
- Menina, desculpa  minha curiosidade. Mas, você é neta de Berenice?
- Sou – a jovem responde cordialmente.
- Por gentileza, diga à sua avó que Godofredo manda lembranças.
Hermenegildo sai de seu silêncio.
- E o rapaz, de onde é?
- Da capital, meu senhor – Berenice responde por ele.
Godofredo tenta disfarçar, mas não esconde o riso ao ver a expressão e o suor escorrendo no rosto de Hermenegildo.
- Seu nome? – Hermenegildo se dirige ao jovem.
- Berenice – responde a jovem pressupondo que a pergunta foi-lhe dirigida.
Ai Godofredo não disfarça mesmo sua satisfação ao ver a saia justa em que se encontra seu compadre.
- Vamos, amor? – convida Berenice.
- Diga à sua avó que também mando lembranças.
- Da parte de quem?
- Diga apenas da parte de Hermenegildo.
- Serão transmitidas – diz a moça.
O rapazinho baixinho e magérrimo acompanha a namorada da maneira que chegou, mudo.
- Compadre, não tem ônibus circular, então...
- Então você paga a pipoca.
- Pago. Quero ver você se engasgando – brinca Godofredo.
E os dois compadres caminham lentamente em direção ao carrinho de pipoca do Bentinho estacionado no lugar de sempre ali na praça.
 
(João Neto)

quinta-feira, 28 de março de 2013

Crônica (Encafifa não...)


Godofredo e Hermenegildo estão sentados no banco favorito. Quatro da tarde.
- Vi algo horas atrás que me deixou encafifado – comenta Hermenegildo.
- Desembucha logo – pede Godofredo.
- No canteiro central da avenida lá de cima, em frente aquela majestosa casa...
- Aquela do bairro chique?
-... Essa. Continuando. Estava um guri sentado de pernas cruzadas...
- Sentado como Buda?
-... Isso, igualzinho escreveu nosso amigo. Continuando. Em frente dele, lado a lado, três pedras de tamanhos diferentes e cores. A primeira – mais ou menos do tamanho de uma bolinha de gude na cor branca, a segunda – mais ou menos do tamanho de uma bola de tênis de mesa na cor magenta, a terceira – mais ou menos do tamanho de uma bola tênis de quadra numa cor que não identifiquei de imediato, me parecendo mistura das outras duas, mas não tenho certeza.
- E?
- Com sua mão direita esse guri sentado como Buda segurava um bodoque, com sua mão esquerda segurava um arco.
- Bodoque e arco... sei, sei.
- Mas é. Não mais que três metros à sua frente, fincado no gramado, um espelho com moldura amarronzada.
- Espelho de moldura amarronzada?
- Pra confirmar, passei pertinho, e vi meu reflexo no vidro, ora essa, e conheço cor. Posso estar meio gagá, mas ainda conheço cor.
- Sei, sei. Continue.
- Ai é que está, compadre. Fora eu, um casal – bem sabe de quem falo - observava o guri sentado como Buda. E o guri entretido que estava, penso, com o bodoque, o arco, as pedras coloridas de tamanhos diferentes e o espelho de moldura amarronzada, aparentemente não se importava ou se apercebia de nossa presença.
- Naquele bairro de gente rica, alguns esnobes,  um guri sentado como Buda, bodoque, arco, espelho de moldura amarronzada, três pedras de tamanhos e cores diferentes, numa véspera de feriado como hoje e ninguém tomou providência? Ará! Tenha dó.
- Pois é.
- E o guri ali, estático, imóvel?
- Mas, compadre, ele estava sentado como Buda.
- Pois vamos pra lá. Quero ver tudo isso “in loco”.
- Não adianta.
- Como não adianta?
- Sumiram.
-!?
- O guri, o espelho, as pedras, o bodoque e o arco. Sumiu e nem demos conta de como aconteceu. Foi só uma piscadela, e cadê ele e tudo o mais?
- Eita! E eu escutando essa besteirada toda.
- Limão ou abacaxi?
- O que?
- Sorvete. Limão ou abacaxi?
- Limão. Teu dia de pagar.
E lá se vão os dois compadres em direção à sorveteria na esquina da praça da matriz da pequena e bucólica cidade interiorana.
 
(João Neto)

quarta-feira, 27 de março de 2013

Crônica (Feitos um para o outro)


Godofredo e Hermenegildo estão iguais postes de iluminação na esquina, canto superior direito da praça da matriz da pequena e bucólica cidade interiorana.
Domingo. A missa está no sermão, pois, mesmo diante do burburinho da freguesia e dos barraqueiros na feira livre, ouve-se a voz grave do padre ecoando pelas caixas de som espalhadas no interior do tempo, só ali, admoestando os fiéis que moderem o comportamento e participem mais das atividades igreja.
Os dois compadres observam, o que mais gostam de fazer, enquanto decidem entre o gostoso pastel de pizza da barraca da Gertrudes, a mais conhecida da feira, e o saboroso e nutritivo caldo de cana do Belarmino, que recentemente deixou a comodidade da aposentadoria para ganhar uns trocados com o engenho de cana.
- Não é a neta da...
Godofredo segue o olhar de Hermenegildo.
- É.
- Mas é mesmo.
Eles se referem ao casal que sobe de mãos dadas atravessando a praça na direção deles.
- Ela é a avó escarrada, incluindo os óculos.
Godofredo ri do comentário do seu compadre.
- E você rastejava na grama por ela.
- Eu era adolescente. Inocente de tudo. Ela me engabelou isso sim.
- Sei, sei.
- E foi. Tanto que quando terminamos o namoro, nunca mais olhei pra cara dela.
- Sei, sei.
- Compadre, isso ficou no passado – Hermenegildo encerra o assunto, contrariado com o rumo da prosa.
O casal de jovens está passando por eles.
- Bom dia. Paz de Deus – cumprimenta o rapaz, trajado de terno e gravata.
- Bom dia. Amém – Hermenegildo retribuiu o cumprimento e a saudação, enquanto Godofredo o faz com um leve movimento da cabeça.
O casal toma rumo à avenida, dois quarteirões acima.
- Feitos um pra outro.  Como pode?  Deus existe. Quem é  o mocinho?
- Não sei, compadre. Não me recorda ninguém que eu conheça – responde Godofredo – Quanto à jovem, até a cor do seu vestido é a cor de preferência da avó.
- Nem me lembre.
- Lembro. Roxo – Godofredo enfatiza a última palavra da frase, rindo.
- Compadre, pelo menos posso dizer que  alguém um dia me amou. E muito.
- Não estou insinuando nada. Roxo.
Hermenegildo opta por calar-se. Sabe que Godofredo o provoca, mas sem maldade. Cinquenta anos de amizade possibilitam conhecer uma pessoa.
- Então, caldo de cana ou pastel?
- Os dois – Hermenegildo decide.
 Enquanto caminham pela calçada, Hermenegildo procura tirar do pensamento a imagem da antiga namorada, avó da mocinha que já alcança a avenida de mãos dadas com o namorado. Ele e Berenice gostavam de passear de mãos dadas nas alamedas da antiga praça da matriz - saudades -  dando voltas ao redor do coreto, sentados no banco, ela recostada em seu ombro, ouvindo a música oferecida à ela vinda do serviço de alto-falante.
De soslaio, Godofredo espia o compadre ao seu lado. Sorri. Sabe exatamente o que ele está recordando. Aquela expressão em seu rosto lhe é bem conhecida.

 (João Neto)

terça-feira, 26 de março de 2013

Crônica (Berenice parece não gostar de mim)


Berenice parece não gostar de mim.
Não sei bem o motivo. Talvez por ser cheia de manias.
E "cheinha" de corpo. Gordinha. Sem ofensa, claro.
Está ao lado de Amélia pra cima e pra baixo nos dias de culto. Na ida pra igreja, durante o culto, no bate-papo depois do culto, na avenida em frente à igreja,  na volta pra casa. Enfim, grudenta como ela só.
Berenice não sorri. Está sempre carrancuda. E a coisa que calça seus pés?? Algo que se assemelha a sapato, ou a sandália? Humm! Sei não. Tem formato de botina... Não, não pode ser. Algum modelo exclusivo, mas não se trata de botina.
Berenice quase não pisca. E quando o faz, os óculos grossos impedem que se perceba. Se é que ela pisca. E aquelas luvas brancas? Pode estar 40 graus ou 4 graus, lá está ela com as mãos enluvadas.
Berenice é monossílaba. Frase com mais de cinco palavras é discurso. Há de existir neste mundo de Deus alguém que explique sua preferência pela cor roxa. Se em algum domingo trajou roupa de outra cor, deve ter passado despercebido. Mas duvido muito.
Berenice é baixinha. Baixinha?
Isso me faz atentar para meu primo Antonio.
Noto que, nas reuniões da mocidade, ele se refere a ela como “cisne”. Cisne?
Meu primo Antonio? Cisne? Patinho feio?
Estalo.
Berenice grudada em Amélia. Antonio a vê como “cisne”. Então... dois mais dois somam quatro.
Antonio é magro e baixo. Igualzinho a mim. Tão tímido como eu. Nem bonito, nem feio. Igualzinho a mim. E solteiro. Igualzinho a mim.
Como incentivá-lo a paquerar, se aproximar, abordar e, se tudo der certo, namorar Berenice?
Pois creio, como creio na existência de Deus, que se sair coelho dessa cartola, rapidinho, rapidinho, acontecerá o mesmo entre eu e Amélia. Namorar Amélia. Sonho meu, sonho meu.
E, se não der certo a tacada com Antonio, apelo pra minha irmã. Afinal, irmã é pra essas coisas, ou seja, acudir o irmão nestes momentos cruciais.
Quem diria que eu teria ideia tão supimpa?
Antonio e Berenice feitos um para o outro. 
Muito bom. Decisão tomada, plano de convencimento providenciado.
Mãos a obra.
Amélia, Amélia, me aguarde.

(João Neto)

segunda-feira, 25 de março de 2013

Crônica (Amélia parece não gostar de mim)


Amélia parece não gostar de mim.
Moça linda, e me ignora. Tudo bem. Não sou bonito bem sei, mas não tão feio que seja deixado às traças.
Também não gosto dela. Mas gostaria de gostar.
Afinal, sua pele macia, seus cabelos sedosos, seus olhos castanhos esverdeados, seus seios formosos, seu corpo cheio de curvas...  Afe! Eu só consigo vê-lo (o corpo, o corpo) sempre escondido debaixo de panos do pescoço aos tornozelos. Nem tanto pano assim esconde tamanhas sensualidade e beleza.
E seu cheiro? Cheiro? Como cheiro? Perfume, gostoso perfume.
De segunda a sexta-feira, cedinho, ela passa pela calçada em frente de casa, e quando está dobrando a esquina de cima, o perfume continua no ar...  Nosso papagaio começa a cantar “Eu tenho tanto pra falar...”, cantando do começo ao fim sem errar ou esquecer um verso sequer. Depois fica o resto do dia quietinho, quietinho.
E nosso labrador? Esquece que eu sou seu dono, não ela.
É.
Amélia parece não gostar de mim. Tenho minhas dúvidas se é bem assim, e até digo isso pra minha mãe e minha irmã, amiga mais íntima dela.
Moça prendada. Trabalha e ainda ajuda nos afazeres da casa. Mora com os pais e mais dois irmãos, o mais velho, da minha idade, companheiro da sinuca no bar do Dito e do futebol no último domingo do mês no clube. Frequenta os cultos dominicais. Estuda. Ótima aluna, futuro brilhante pela frente.
Sou tímido, bem sei, mas não sou pestilento. Ora essa! Não me considero ótimo partido, nem de se jogar fora.
Talvez, e só talvez, se melhor me conhecesse, ela entendesse o que realmente está acontecendo.
Ou seja,  que estou caidinho por ela.
Quando mencionei “que também não gosto dela”, foi só pra disfarçar esse sentimento que toma conta do coração, do espírito, da mente, tipo “corpo e alma” daqueles que se rendem aos encantos de uma mulher. No caso aqui, eu.
 Também confesso que “gostaria de gostar” quer dizer “estou apaixonado loucamente por ela”.
O que me resta?
Contrariar quem diz “esse rapaz não presta, um dia está com uma, outra dia com outra, quando não com as duas ao mesmo tempo”, ou quem exclame quando me vê com as gêmeas  (quinze anos, lindas de dar dó),  ”viu só, eu tinha razão, ele não presta”, sem sequer saber que são minhas primas mesmo, filhas da irmã mais nova de minha mãe.
Decidido. Vou mudar.
Primeiro. Não frequentar mais o bar do Dito no sábado à tarde, esquecer as pescarias, e, claro, concluir a faculdade.
Segundo. Aplicar-me e dignificar ainda mais o ambiente de trabalho, aprender mais e mais meu ofício e, claro, economizar, deixar de ser mão aberta.
Parar de em apresentar tão desleixado. Tipo, banho todo dia. Faça calor, frio, faça sol, faça chuva. Usar desodorante, “perfuminho” discreto aos sábados e domingos. Escovar os dentes de manhã, após as refeições e antes de dormir. Diariamente.  Sim, claro, andar alinhado, nos trinques, como dizia meu avô.
Terceiro. Estar assim como não quer nada nos mesmos ambientes por ela frequentados, o que inclui a igreja.
Amélia, Amélia, me aguarde.

(João Neto)

domingo, 24 de março de 2013

A verdade é bem maior


Me disseram que há mais gente crendo menos
Que a ciência não precisa da religião
Não discuto qual das duas é melhor
O que eu sei é que a verdade é bem maior

(REFRÃO)
O que eu sei é que além do horizonte existe uma luz
Que brilha sempre, sempre, aleluia, amém
O que eu sei é que quando escurece aqui dentro de mim
Para além do horizonte existe uma luz que não tem fim (2 X)

Me disseram que a verdade é relativa 
E que a fé também não precisa da religião
Não discuto com meu interlocutor
O que eu sei é que a verdade é bem maior

REFRÃO

Me disseram que Jesus já é passado
Que cedeu seu lugar para um outro pregador
Não discuto sobre um novo libertador
O que eu sei é que a verdade é bem maior

REFRÃO

Salve Pe. Zézinho
(música: A verdade é bem maior)

"...  Não discuto, não discuto." (João Neto)

sábado, 23 de março de 2013

Crônica (No lanche vespertino)


- Quem entende.
Os dois jovens estão na sala da casa. A televisão está ligada, na tela imagens de um programa esportivo.
- Quem entende?
- Estive pela manhã na quadra do clube...
- E?
Da cozinha, a mãe chama pela jovem.
- Depois eu termino.
Enquanto a jovem atende ao chamado maternal, seu irmão permanece na sala acompanhando o jogo de futebol entre dois times europeus.
- Cadê seu irmão?
- Na sala.
A mãe chama pelo filho, enquanto pede à filha ajuda-la na arrumação da mesa para o lanche vespertino.
- Vá chamar seu pai. Ele está no computador – pede a mãe ao filho que está atravessando a porta, que de imediato dá meia-volta.
 - Mãe, lá no clube aconteceu um fato que não concordei muito.
-  O que seria, filha?
As duas mulheres terminam a arrumação  da mesa.
- Estava tendo um jogo de vôlei, e o diretor esportivo...
- Emerenciano.
- Ele mesmo, mãe.
- O que ele fez desta vez?
A adolescente senta em sua cadeira, enquanto a mãe faz o mesmo. Neste momento entra o pai, logo atrás dele o adolescente. Ambos sentam em suas respectivas cadeiras.  
- Como eu dizia pra mamãe...
- Emerenciano novamente, amor – a mulher comunica ao marido.
- ...Então, como eu dizia – prossegue a adolescente, enquanto passa requeijão na fatia do bolo de fubá – parece que um novo sócio, acompanhado da filha, se aproximou dele, durante a partida de vôlei, sugerindo educadamente algo no sentido de melhorar a prática esportiva. Algo como interagir com as demais atividades que o clube oferece.
- E, como sempre, ele esbravejou, deixou o sujeito falando sozinho, foi até a porta do ginásio, acendeu um cigarro (prá alguém ligado ao esporte, nada recomendável) e não conversou com mais ninguém.
- Como você sabe disso, pai?
- Mana, dê poder a alguém e verás quem realmente ele é...
- Olha só meu irmão. Filosofando.
Pais e filhos sorriem gostosamente.
- Na verdade, filha, ou ele muda de atitude, sendo mais positivo, ou acaba perdendo apoio daqueles realmente interessados em contribuir.
- Talvez alguém deva falar com ele ou com a diretoria do clube, amor – a esposa interfere com mansidão.
- Passa a jarra de suco de limão, mana – pede o adolescente à sua irmã gêmea.
A família curte esse momento de conversar, colocar os assuntos em dia.
- Vamos falar sobre a escola – diz o pai – Esse assunto do clube, cabe a quem de direito resolver. Nossa atitude, penso,  é ajudar quando nos for solicitado. Afinal, sabemos que ter acesso ao esporte, à cultura e ao lazer é bom pra todos, não é mesmo?
Os demais membros da família concordam.
Lá fora, a vida continua como sempre na pequena e bucólica cidade interiorana.

(João Neto)

sexta-feira, 22 de março de 2013

Crônica (O casal de "filosófos")


- Que os desmandos acontecem a céu aberto.
- Anotado.
- Que os gabinetes são decorados ricamente.
- Anotado.
- Que os mandatários se intitulam visionários.
- Anotado.
- Que o cidadão recebe diariamente pérolas alucinógenas.
- Anotado.
- Que cultura e lazer são objetos esquecidos na prateleira empoeirada.
- Anotado.
- Que todos sabem quem é o comandante da “esquadrilha da fumaça”.
 - Anotado.
- Que o papel carbono do bom governante está jogado no lixo.
- Anotado.
- Que grupelhos agem como administradores futuristas.
- Anotado.
O casal está sentado na mesa do fundo da padaria localizada na região central da pequena cidade e bucólica cidade interiorana. O moço fala e a moça digita no notebook, enquanto lancham.
Corte rápido.
- Compadre, quem é aquele casal sentado na mesa do canto?
Hermenegildo acompanha o olhar de Godofredo indicando a mesa.
- Eu vi a balconista dizendo que é “o casal de filosófos”.
- Filósofos – corrige Godofredo.
- Não. “Filosófos”. Assim a moça falou.
Os dois compadres se servem do petisco do prato à sua frente, na mesa.
Sexta-feira chuvosa. Friorenta. Duas horas da tarde.
- São novos na cidade, compadre.
- São.
- “Filosófo” faz o quê?
- Não tenho a mínima idéia.
O casal da mesa do fundo fica em pé, caminhando em direção ao caixa, passando pelos dois compadres.
- Não parecem com ninguém que eu conheça. Não são de família daqui.
- Não são. Casal bonito. O branco fica muito bem pra eles.
Os dois compadres observam o casal entrando num “carrão antigo reformado inteirinho” – segundo a ótica deles - estacionado do outro lado da rua, acionando o motor, deixando o local.
- Sei não. Desconfio que esse casal tenha sido contratado pela administração.
- Deve ser. Estão contratando todo mundo. É só espernear, dar uns gritos, ou ameaçar contar o que sabe, arrumam um cargo rapidinho.
- Isso é. Mas também pode não ser.
- Verdade. Pode não ser.
Os dois compadres beliscam o petisco e bebem um gole de suco de laranja.
A vida continua na pequena e bucólica cidade interiorana.

(João Neto)

quinta-feira, 21 de março de 2013

Poesia (Diga aos homens)


Diga aos homens que sou sacana,
Não se acanhe. Se necessário grite.
Mas antes quero que se conscientize,
Ilusão é pisar no asfalto como grama.

Diga aos homens que sou louco,
Não se acanhe, grite até ficar rouco.
Mas antes quero que entenda,
Idiotice é desaparecer por uma fenda.

Diga aos homens que sou inconsequente,
Não se acanhe. Rouco, repita até ficar mudo.
Mas antes quero que tenha em mente,
Silêncio é compreendido apenas pelo surdo.

Diga aos homens que sou maldito,
Não se acanhe. Mudo, solte o grito.
Mas antes quero que fique explícito,
Não malhe em ferro frio o que eu digo.


quarta-feira, 20 de março de 2013

Crônica (Foi só um susto, gente)


- Pique no lugar – a orientação da esposa ao esposo é imperativa.
E o esposo, que de bobo não tem nada, só ali, movimentando as pernas como se estivesse num tiro de cem metros, final de olímpiadas no Brasil e ele o único brasileiro entre os oito finalistas.
Na realidade estão em uma área de lazer da pequena e bucólica cidade interiorana.
Poucos metros adiante aparelhos de exercícios físicos ao ar livre para idosos. O esposo tem consciência que seu destino é completar o circuito com sua esposa caçoando o tempo todo dele. Molenga.
Ela, cinquenta anos, faz daqueles exercícios brincadeiras juvenis.
Ele, cinquenta e cinco anos, faz daqueles exercícios sessões de tortura.
- Vamos, vamos, mais duas voltas.
Duas voltas?
O esposo se prepara para duzentos metros de corrida. Lenta, mas corrida.
“O importante é que mais tarde recompensarei esse sacrifício todo com aquela cerveja que está me esperando na geladeira” – pensa o esposo. Baixinho, porque de repente ela pode ouvir seu pensamento, mesmo estando uns dez metros a sua frente e o chamando para alcança-la. “Dio mio, Dio mio”.
Aliás, ele nunca entendeu o motivo dela determinar que aqueles exercícios acontecessem diariamente, sempre às seis horas, com frio, com chuva, esteja calor – naquele horário, dificilmente faz calor. Aliás, comprova quase todos os dias pessoalmente essa evidência meteorológica.
Tudo bem. O esposo sabe que tudo é por amor. Como diz seu chefe na repartição, “A morfética...”. Brincadeira. Apropriado, aliás. Morfeu, deus dos sonhos, filho da noite e do sono. Sono, doce sono.
- Não para, espertinho, ainda restam os exercícios – a voz que diz “Te amo” com tanto carinho é tão cruel nesse momento.
E por que a esposa teima, insiste mesmo, que o esposo perca 70 de seus cento e quarenta quilos? Só por que ela pesa 50? Foram longos anos de labuta, comilança e “bebança” (pra rimar) até adquirir aqueles quilos a mais, que fique aqui esclarecido. E, essa é razão de não querer perde-los. Acostumou-se em carrega-los para cima e pra baixo.
Corte rápido.
A ambulância se aproxima em velocidade, parando na porta da emergência da Santa Casa, onde já está de prontidão a equipe médica.
- Princípio de infarto – comunica o motorista.
Quando a porta traseira é aberta... Epa! Cento e quarenta quilos e um sorriso desenxabido nos lábios.
- Foi só um susto, gente – a aliviada esposa esclarece, preocupada que descubram, inevitável, que seu esposo baqueou, estatelou-se ao chão de cansaço.
E quem o ergueria?

(João Neto)

terça-feira, 19 de março de 2013

Crônica (Aqueles sentados como Buda)


Hoje, terça-feira, é o dia do silêncio para aqueles sentados como Buda.
Silenciam em respeito àqueles que vivem, respiram, mas não percebem estarem morrendo.  Vivem, mas seus olhos não são janelas de suas almas. Respiram, mas seus corações não são recipientes de bons sentimentos. Morrem lentamente.
Silenciam em memória daqueles que caminharam por este mundo e depois que se foram, tornaram-se lendas.
Silenciam em desaprovação àqueles que detêm o poder e esquecem que o poder é emanado pelo povo, mesmo certa parcela povo não tendo a consciência cidadã de ser a origem e finalidade de se exercer o poder, seja qual for esse poder.
Silenciam indignados pela certeza de que num tempo não muito distante a natureza restará, pela ação do homem, em fotos e pinturas expostas à admiração daqueles que não a conheceram.
Silenciam revoltados pelos palcos armados em prédios suntuosos construídos em bairros de classe média de cidades esquecidas pelos governantes, onde poucos indivíduos agem como signatários de um poder que não possuem, não merecem, e por ele se degeneram.
Silenciam por não aceitarem a indiferença dos indivíduos que trazem em si a liderança nata e sadia por qualquer acontecimento que possa invadir seu território de conforto.
Silenciam ironicamente pelo besteirol dos políticos, regra máxima.
Hoje, terça-feira, é o dia do silêncio para aqueles sentados como Buda.
Que esse silêncio seja respeitado nos púlpitos, nos gabinetes, nas salas de aula, nos estabelecimentos comerciais, nas salas de espera, em qualquer outro local onde haja uma ou mais pessoas, onde se encontre qualquer outro animal.
Que esse silêncio seja compreendido pela criança, pelo adolescente, pelo jovem, pelo adulto, pelo idoso.
Que esse silêncio seja ouvido por quem de direito.
Amanhã... amanhã, quarta-feira.  

(João Neto)

segunda-feira, 18 de março de 2013

Crônica (Feito Estátua)


Aos poucos os curiosos rodeiam o indivíduo magro feito estátua bem no meio da praça, sua identidade inviolável pelo traje com as cores da bandeira que o cobre da cabeça aos pés. Algumas pessoas a caminho do trabalho ou em outro afazer, ao passar dão uma olhadela e continuam seu trajeto.
Segunda-feira. Entre oito e nove horas.
Se alguém contasse, a roda contaria com cerca de vinte pessoas, talvez mais, talvez menos. Mas ninguém está a fim de contar.
A semana de trabalho está começando na pequena e bucólica cidade interiorana.
E o indivíduo magro feito estátua paradinho, paradinho.
O misto de jardineiro e vigia corre para o paço municipal.
A balconista bonitinha fotografa com seu telefone celular, enviando via Facebook para as amigas.
O cambista do jogo de bicho cumprimenta com um aceno os policiais que estacionam a viatura defronte a agência bancária, ficando a observar o movimento do interior do veículo.
E o indivíduo magro feito estátua paradinho, paradinho.
Ninguém ousa se aproximar.
Até porque fixado nas quatro caixas empilhadas, seu pedestal, um cartaz feito de cartolinas na cor branca com os dizeres “O tempo está chegando, sorrateiros se cuidem, quem viver verá", em letras garrafais multicoloridas.
Um guri, a pedido da mãe, que está na roda, corre em direção da viatura, mas volta mais rápido ainda, com cara de assustado, se agarrando na perna da mãe.
O misto de jardineiro e vigia surge na porta do paço municipal, trazendo nas mãos dois copinhos de plástico com café quentinho, caminhando sossegada até a praça,  se juntando ao cambista que está encostado na parede do palco,  passando-lhe um dos copos.
De repente, não mais que de repente, o céu que está claro é coberto de nuvens cinzentas, começando a chuviscar, segundos depois se transformando num temporal.
As pessoas correm, se dispersando, a viatura policial deixa o local, restando na praça o indivíduo feito estátua e o jardineiro misto de vigia protegido comodamente no quartinho existente no palco.
Quanto ele resolve chamar o individuo magro feito estátua pra se proteger do temporal, cadê o pedestal, cadê o cartaz, cadê o maluco?
Corte rápido.
- Foi assim que ele me contou ter feito “a experiência”, compadre.
Godofredo olha para Hermenegildo. Os dois compadres estão na sorveteria ao lado da praça saboreando sorvete de groselha na taça.
- E por que “Zé de Truta” faria uma experiência dessas debaixo daquela chuvarada que caiu hoje de manhã?
Hermenegildo, levando uma colherada à boca, fica a pensar enquanto degusta o delicioso sorvete. Então responde.
- Sei lá.

 (João Neto)

domingo, 17 de março de 2013

Se compreendesses o Dom de Deus


Se compreendesses o Dom de Deus,
Se compreendesses o amor que Deus tem por ti
Se descobrisses o que Ele quer te presentear

Se compreendesses como te amo,
Se compreendesses como te amo
Deixarias de viver sem amor
Se compreendesses como te amo
Se compreendesses como te amo
Deixarias de mendigar qualquer amor
Se compreendesses como te amo, como te amo
Serias mais feliz

Se compreendesses como te busco
Se compreendesses como te busco
Deixarias minha voz te alcançar
Se compreendesses como te busco
Se compreendesses como te busco
Deixarias que te falasse ao coração
Se compreendesses como te busco, como te busco
Escutarias mais minha voz

Se compreendesses como te sonho
Me perguntarias o que espero de ti
Se compreendesses como te sonho
Buscarias o que tenho pensado para ti
Se compreendesses como te sonho, como te sonho
Pensarias mais em mim

Salve Irmã Glenda 
(http://www.youtube.com/watch?v=skwBBQHIFYs)
Salve Adriana
http://www.youtube.com/watch?v=dWM_uvs0Slw
(música: Se compreendesses o Dom de Deus)

Na horizonte diante dos nossos olhos, na amplitude de nossa voz, no toque de nossa mão, na sensação de nosso paladar, no silêncio que nos envolve entre a multidão, no equilíbrio de nossa mente, no sentir de nossa emoção, assim harmonizamos nossa fé, verdade amorosa, caminho de paz”
                                                                                  João Neto

sábado, 16 de março de 2013

Crônica(Dois compadres II)


Final de semana. Sábado.
- Chuvinha boa, Godofredo.
- Boa.
Os dois compadres estão sentados numa das mesas da padaria localizada no centro da pequena e bucólica cidade interiorana, ao lado da igreja matriz.
- Esse tempo me faz meditar.
- É?
Hermenegildo olha para o compadre, suspira.
- E?
Hermenegildo continua calado.
- Desembucha logo – insiste Godofredo.
Neste exato instante um casal caminha em direção à praça poucos metros abaixo, pela calçada do outro lado da rua. Pelo vidro que veda uma das portas do estabelecimento, Godofredo e Hermenegildo o observam atentamente, curiosidade aguçada.
O rapaz protege a cabeça com o capuz da blusa. A moça está debaixo da sombrinha que impede o chuvisco atingi-la.
Os dois compadres sabem, pelas conversas diárias na praça, que o jovem casal está no centro do vulcão prestes a explodir. Dentre vários ensinamentos de  “Zé da Truta”, pensador local, amigo de Hermenegildo e Godofredo,  consta este – no qual meditava Hermenegildo - certa atividade cidadã é praticada com revanchismo, perseguições, acomodações de apadrinhados, coronelismo e outras modalidades que a censura não permite serem mencionadas; o que antes era “meu jeito de fazer é esse, quem está do meu lado, está do meu lado, quem não está do meu lado, sifu, ou seja, aos amigos as benesses da lei, aos inimigos o rigor da lei” hoje está travestido de religiosidade, ou seja, lobo em pele de cordeiro.
- Você estava meditando...? – a voz de Godofredo os traz de volta ao interior da padaria.
O jovem casal distancia.
- Coitado desses dois. Tão novinhos e cheios de vida, com um futuro maravilhoso pela frente – pensa em voz alta Hermenegildo.
- Quando entraram nessa, suponho que tinham consciência de serem apenas soldados nesse imbróglio todo – argumenta com pragmatismo Godofredo.
- Será, compadre? E o idealismo? A juventude engajada?
- Compadre, há quantos anos estamos testemunhando acontecerem coisas inomináveis?
- Faz tempo.
- Então. Quem entra na chuva é pra se molhar.
A balconista se aproxima com o pedido, deixando sobre a mesa as duas xícaras de café expresso, retornando ao balcão, ao lado do caixa, porta de entrada, onde está a gerente.
- Eles estão falando do assunto do momento, o casal?
- Acertou em cheio.
Corte rápido.
Segundo se comenta na pequena e bucólica cidade, “Zé da Truta”, inveterado bebedor, diz sempre que numa situação onde os superiores permanecem nos bastidores, aqueles que estão na linha de frente são peças descartáveis. Diz mais, no futuro, caso sobrevivam, continuarão sendo o que sempre foram, ou seja, meros soldados. “Zé da Truta” diz, entre um gole e outro,  que essa atividade não se assemelha ao jogo de xadrez, seria muito nobre, e sim a uma guerra cujos participantes não possuem escrúpulos ou arrependimentos. E conclui sem muito entusiasmo que um dia tudo irá mudar, e será pra melhor, pois pior não pode ficar. 

(João Neto)

sexta-feira, 15 de março de 2013

Poesia(Sei de mim)


Talvez toquemos a eternidade
Ou a vida em nós se exaure
Talvez vivamos presos no que somos
Ou livres no seio da sociedade
Talvez respiremos novos ares
Ou aderimos ao mesmo carbono

Não importa

Sei de mim, fiduciário do meu próprio tempo
Caminhante solitário, sabre do vento
Libertário, ventura beirando atrevimento

Não tem volta

Meu querer o homem não molda
Meu fazer o sentimento não sufoca
Assim vivo, viverei, não mudo a rota 

(João Neto)

quinta-feira, 14 de março de 2013

Cronica (O telefone...)


Jorge Mario Bergoglio.
1º latino-americano.
1º jesuíta.
1º Francisco.
Que tudo corra bem pra ele. E que a Igreja Católica Apostólica Romana (como diz um grande amigo, igreja com “cnpj” é invenção do homem) tenha  um líder antenado com as coisas do mundo e guiado em seu pontificado pelas coisas espirituais. E que não o etiquetem sucessor de Pedro. Se o fizerem, será uma judiação.
Francisco I é apenas um argentino de 76 anos de idade que devotou sua vida a uma causa religiosa e que a partir de agora possuí uma missão definida neste século XXI.
Mas, o assunto aqui é outro. Religião, igreja, cada qual com seu bornal.
2014. Copa do mundo, Brasil. E, mais certo que ré não é andar pra frente, Messi vem aí.
Tudo bem. Dizem que por esses dias lançarão sorvete de cerveja. Se até lá ainda estiver no mercado, que venha o jogador de futebol argentino.
Papa argentino, melhor jogador do mundo argentino. Ou seja, a América do Sul está com tudo. América do Sul de língua espanhola.
 Sei não a América do Sul de língua portuguesa. No futebol, bem entendido.
Mas o assunto aqui também não é futebol.
Alguém comentou (na verdade, fofocou) que o assunto do momento é como Francisco I se comunicará com Deus.
Seria essa sua primeira dificuldade. Não que o papa não tenha fé. Não é isso.
É que assim como o presidente dos Estados Unidos possui o “telefone vermelho”, ou algo assim, o papa teria a possibilidade de conversar com Deus por um telefone especial. Arranjo antigo, intermediado pelos anjos e arcanjos e o Espírito Santo. É o que folclore.
O Vaticano esconde, os melhores policiais do mundo estão investigando com afinco algo que está intrigando desde o mais incrédulo dos ateus ao mais crente dos católicos.
O que seria? Eu também desejo saber o que seria.
Alguém deixou escapar, tipo confidência feita exatamente para se espalhar, que o telefone estaria sempre com sua linha ocupada e, é lógico,  não seria o papa ou algum preposto quem o estaria utilizando.  Pior. O telefone não estaria nem no Vaticano. Aliás, segundo essa confidência, a renúncia do papa anterior teria como principal motivo esse desaparecimento do telefone.
Corte rápido.
Numa bucólica e aprazível cidade interiorana do estado mais rico da grande nação sul-americana, dois compadres conversam na praça da matriz.
- O que acha do novo papa?
- Muito bom.
- Muito bom?
- Muito bom, ué.
- E será que “sabe de quem estou falando” devolverá o telefone?
- Calado, compadre. Ninguém sabe que o telefone está aqui em nossa cidade.
- Será?
- Tenha fé. Ninguém sabe. E quem garante que é o telefone do papa? Deixa que “sabe de quem estou falando” se arvore em estar em contato com Deus o tempo todo
Os dois compadres, Hermenegildo e Godofredo, “fecham o bico”.
Em assunto divino a prudência é garantia de ter seu lugar ao sol. No céu.
- E o Messi?
Godofredo dá uma olhada de soslaio, sobrancelha direita erguida,  para o compadre sentado ao seu lado no banco, debaixo daquela sombra gostosa.
- Messi? Ará. Sou brasileiro. Messi que vá catar coquinho.

(João Neto)