segunda-feira, 11 de março de 2013

Crônica(O casal dançante, 2º texto)


O som inunda a ampla sala. O casal rodopia ao som da música.
M – Ele ainda está em contato, presumo.
F – Presumo?
M – Tá bom. Desculpe-me.
F – Fique tranquilo. O telefone está comigo.
O casal gira pela ampla sala. Móveis novos, tapete novo, cortina nova.
M – Precisamos insistir nisso. O cerco está apertando.
F – Não estamos em Jericó.
M – Mas as trombetas são ruidosas.  
A dança continua. O casal está feliz. Tudo está saindo como o planejado.
F – Como estou?
M - Linda.
F – Eu sei.
A dança leva o casal ao êxtase quase divinal.
M – Vamos parar. Tem a papelada sobre a mesa.
F – Esquece a papelada.
M – Precisamos demonstrar que estamos imbuídos de boa vontade. Faz parte.
F - Não. Quero continuar dançando.
Como sempre, ele cede. Também faz parte.
M – Ele está nos vendo.
F – Ele entende.
M – Acredita nisso?
F – Claro. E você?
M – Se você acredita, eu acredito.
F – Quer saber? Chegamos às nove. Quase nove e quinze. Vamos pra casa.
M – E a papelada?
F – Depois, depois.
M – Está certo.  Ele pode se chatear e nos tirar a proteção.
F – Não se preocupe. Ele falou comigo hoje pela manhã.
M – Verdade? E eu nem percebi.
F – Sempre foi assim.
                          M  – Vamos embora então.
E o casal de mãos dadas caminha em direção à porta, a música inundando a ampla e confortável sala.  Desligando o som, ligando o equipamento de vigilância, o casal passa pela porta, fechando-a.
Com seu sorriso preferido, o de nº 9,  a esposa coloca as chaves entre os seios que surgem discretamente do sensual decote do vestido justíssimo realçando as curvas do belo corpo.
Com a expressão irônica de sempre, o esposo caminha com os olhos fixos num ponto qualquer, enquanto desce os degraus que leva o casal ao corredor de saída.
Como acontece sempre ao sair do assobradado, o casal topa com o louco cantor assobiando em ritmo de samba a música valsada que dançavam.
Afe.
(João Neto)