No
dia seguinte, Zé da Truta está sentado em seu banco de costume na praça da
matriz da pequena e bucólica cidade interiorana.
Apesar
do sol e céu claro, o frio dá sinal de sua presença.
Zé
da Truta observa o invólucro lacrado que Risadin e Coverdin ofereceram gratuitamente
à rapaziada.
Aqueles
dois fanfarrões tinham deixado a cidade. Eles se foram como chegaram, ou seja,
ninguém sabe o motivo de terem vindo e muito menos a razão de terem ido. O
pessoal até estava se acostumando com o jeito engraçado deles.
Zé
da Truta continua a observar o invólucro lacrado ao seu lado no banco.
No
dia anterior, Risadin e Coverdin, logo depois da praça se esvaziar, desceram do
tablado e se aproximaram deles. No caso, ele, Zé da Truta, e os compadres, Hermenegildo
e Godofredo. Sem nada dizer e não dando chance de recusa, ofereceram graciosamente
a cada um deles a tal substância contida naquele invólucro lacrado.
Os
compadres levaram o respectivo invólucro pra casa, deixando a praça
imediatamente, contentes pra chuchu. Zé da Truta riu ao perceber que esconderam
o invólucro por dentro da camisa, atitude espalhafatosa, pois o volume aparecia
nitidamente. Mas as poucas pessoas com quem cruzaram no trajeto não se perceberam
ou não deram muita importância a isso.
A substância que traz ao nosso consciente o que nos
surpreende sempre, Zé da Truta
recorda-se dessas palavras de Risadin e Coverdin.
Pois seja.
Zé da Truta na sua cachola de “filosófo” e no
seu coração de beberrão resolve fazer um teste para comprovar a eficácia tão propagada
pelos “din”.
Ele explora o ambiente. O misto de jardineiro
e vigia está varrendo as alamedas com a vassourão de piaçaba. O banheiro
público debaixo do palco vazio. O frio impede que os “p.m” (gosta de chamar
seus amigos, os aposentados frequentadores assíduos da praça, dessa maneira, “p.m”
(exatamente isso), até porque eles não se importam, na verdade até incentivam) estejam
por ali. É certo que ao entardecer não faltará nenhum. A rapaziada do sossego
normalmente aparece nesse horário.
Zé da Truta olha em direção à banca de
jornal. A moça que está folheando revistas é gente de primeira qualidade. Olhadela
no ponto de táxi ao lado da banca. Talvez dois ou três dos nove taxistas possam
servir de cobaias.
Seu campo de visão se expande aos
estabelecimentos comerciais ao redor da praça. As funcionárias das lojas, os
atendentes das farmácias, as balconistas da padaria, os companheiros do mais
antigo bar, talvez alguém da associação comercial, ou as bancárias
uniformizadas, não se esquecendo do pessoal da delegacia. Não. Nem pensar da
secretaria da igreja.
Está ele nesse métier quando se flagra a olhar para um dos nove mais antigos sobrados
da localidade.
“Não.
Ali não. Risadin e Coverdin certamente estavam troçando quando citaram aqueles
dois exemplos, e por não conhecerem nossa gente não sabiam que nesse sobrado é
comum o povão encontrar pessoas probas transitando, algumas da melhor qualidade
de nossa cidade”, ele pensa com um sorriso enigmático nos lábios, satisfeito
consigo mesmo pela audácia em destacar o prédio como local ideal para seu
teste.
Pelo sim, pelo não, decide continuar por
continuar em sua pesquisa com a finalidade de encontrar a cobaia perfeita,
enquanto assobia uma de suas canções preferidas.
E
quem não acredita, grita então
Se
gritar “pega ladrão”, não fica um, meu irmão
Se gritar “pega ladrão”, não fica um
Se
gritar “pega ladrão”, não fica um, meu irmão
Se
gritar pega ladrão, não fica um
(Salve Bezerra da Silva, Salve Fundo de
Quintal)
João Neto