Domingo,
onze horas, naquela pequena e bucólica cidade interiorana apesar do sol e do
céu claro, o jovem sozinho, acabrunhado, sentado no banco da praça.
Algumas
pessoas percorrem as barracas da feira livre na rua ao lado procurando produtos
com preços mais em conta. O pipoqueiro encerrou o expediente a cerca de meia hora,
mas continua no seu ponto na praça, em frente da escadaria da igreja matriz, conversando
com aquele senhor que também frequenta a praça todos os dias.
O
jovem sozinho, acabrunhado, sentado no banco da praça, seus olhos não
escondendo o sentimento que traz no coração.
-
Logo, logo, acaba essa farra cívica toda e tudo volta a tranquilidade de antes –
afirma Acácio ao pipoqueiro de cabelos brancos.
-
Será? – duvida o pequeno homem.
-
Acredite – Acácio reafirma sua convicção.
-
Sei não, sei não – reluta o pipoqueiro enquanto guarda a féria no bolso do guarda-pó
branco com algumas manchas de gordura.
As
duas mulheres de toca na cabeça desarmam a barraca de pastéis. Na feira livre duas
ou três barracas ainda expõem seus produtos aos poucos fregueses, enquanto a
maioria dos barraqueiros já se prepara para deixar o local, arrumando seus
apetrechos e produtos nas camionetes, peruas, carros e carrinhos de pedreiro. Garis
e margaridas iniciam o trabalho de limpeza da rua.
O
jovem sozinho, acabrunhado, sentado no banco da praça, seus olhos não
escondendo o sentimento que traz no coração, ombros caídos.
De
repente um frango escapa da gaiola, numa fuga entre desengonçada e esperta, num
ziguezaguear hilariante, com o rechonchudo chacareiro em seu encalço,
acompanhado da raquítica esposa, e de todos os vira-latas que estavam por ali.
A ave passa por canteiros, voa por sobre bancos, o casal pega não pega, os cães
quase abocanhando uma suculenta refeição. Da quantia de doze, eles venderam
apenas um, e não perderiam aquele danado de jeito nenhum, até porque em razão
desse vexame que lhes impinge, será a mistura do almoço.
Sequer
percebem o rapaz sozinho, acabrunhado, sentado no banco da praça, seus olhos
não escondendo o sentimento que traz no coração, ombros caídos, mãos juntadas descansando no colo, quando finalmente o chacareiro consegue captura-lo
junto aos seus pés. Enquanto logo atrás sua esposa espanta a chutadas os cães
famintos que teimam em surrupiar-lhes o futuro defunto assado, o chacareiro leva
raivosamente o frango pelas asas – que cocorica em altos brados prevendo o
destino que lhe é reservado - em direção
à camionete, se preparando para
enfrentar a gozação e os risos dos demais companheiros de feira-livre.
Acácio
e o pipoqueiro riem a valer. Os garis e margaridas se apoiando nas vassouras
também não seguram o riso, aguardando que se esvazie por completo a rua, o que
acontece minutos depois.
Quando
terminam a varrição, Acácio e o pipoqueiro se foram, a rua deserta e limpa,
pronta para a segunda-feira, quando o movimento reinicia, num monótono e monocromático
vai e vem de carros e pessoas.
O
rapaz sozinho, acabrunhado, sentado no banco da praça, seus olhos não
escondendo o sentimento que traz no coração, ombros caídos, mãos juntadas descansando no colo, ao seu lado
um envelope com destinatário e sem remetente aberto deixando surgir réstia de
uma folha de caderno de brochura, com escrita delineada em caneta tinteiro
preenchendo suas linhas.
Meio-dia.
Apesar do sol e do céu claro, o dia continua friorento.
Garis
e margaridas caminham lado a lado em direção ao veículo que os espera duas
quadras acima, conversando ironicamente sobre os últimos acontecimentos que
poderão trazer melhorias ou piorar o que os detentores do poder a muitos anos afligem
aos habitantes daquela pequena e bucólica cidade interiorana que ainda não
entrou no século XXI.
Agora
a praça da matriz está vazia. No banco o
envelope sem a folha.
A
vida segue sua rotina.
João
Neto
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