“Estou a dois passos do paraíso
Não sei se vou voltar
Estou a dois passos do paraíso,
Talvez eu fique,
eu fique por lá”
A música da Blitz tocada distante chega aos
ouvidos do moço sentado no banco da pequena praça do bairro residencial de
classe média da pequena e bucólica cidade, protegido do sol do meio-dia pela
sombra de uma de suas árvores, enquanto contempla o prédio branco à sua frente.
Um jovem aguarda em pé cerca dois metros
do banco, olhos fixos na rua, sentido contrário, quando vê a adolescente caminhando
em sua direção, trazendo no ombro uma mochila escolar.
- Oi – ela cumprimenta brejeiramente, recebendo
um leve beijo.
Abraçados pela cintura, iniciam a
travessia da praça.
No exato momento que passam pelo banco
onde está o moço, acontece.
- Pega, pega – a gritaria vem do outro
lado, frente do prédio branco.
Pelo corredor lateral do prédio, surge o
guri perseguido por um homem fardado e outro baixinho, os dois gordinhos. E
correm na direção deles.
Tudo é muito rápido.
O guri, desviando do casal, dá de topo com
o moço, que, diante da gritaria, está em pé, e o encontrão é inevitável. O
casal pra não ser atropelado pelo guri pendera de um lado, desequilibrando-se,
ficando na linha de corrida dos gordinhos, que não conseguem frear, acontecendo
o encontrão, todos caindo pra frente, por cima do guri e do moço, que, então, estão
estatelados no chão.
Corte rápido.
Entre “mortos e feridos”, salvaram-se
todos.
Ah, mas não termina aí.
Com o guri não foi encontrado o “telefone
divino”, utilizado por determinada pessoa para contatos de terceiro grau com o
Céu, e motivo pelo qual estava sendo perseguido.
O baixinho gordinho explicou que ajudou
na perseguição por inércia, ou seja, alguém passando correndo por ele ligou seu
automático.
O gordinho fardado salientou que apenas obedeceu
ao comando superior para deter a escapada do guri, a quem não conhecia até
aquele momento.
O casal de namorados acabou descoberto
pelo pai autoritário da adolescente e teriam que namorar ainda mais às
escondidas dali em diante.
O solitário moço que apenas fazia a
sesta do almoço foi o urubuzado.
Primeiro, de nada adiantou argumentar ser
um simples viajante. Segundo, não
conseguiu explicar o “telefone divino” dentro da maleta que, segundo afirmara
pouco antes, trazia seu notebook. Terceiro, nem o mais crédulo dos ouvintes acreditou
quando acusou o guri de causador de toda aquela confusão e de ter se apoderado
do notebook.
As pessoas presentes na minúscula sala
do subsolo do prédio branco só viam a auréola sobre a cabeça do guri que
aguardava na sala mais espaçosa do prédio.
“Estou a dois passos do paraíso
Não sei porque eu fui dizer bye
bye”
Quando a voz de Evandro Mesquita entrou
pela entrada de ar rente ao piso da alameda, o viajante enlouqueceu.
O que se comenta nas rodinhas de todas
as tardes na praça da matriz é que funcionários foram surpreendidos estonteados
e esparramados pelo chão do disfarçado arcabouço, menos o viajante que, assim
como o guri, nunca mais foi visto.
E, duplo azar, sumiu de vez o “telefone
divino” e um notebook foi encontrado pela faxineira na lixeira do gabinete
principal.
E o sumiço do “telefone divino” causou
escândalo de tal proporção que originou uma crise entre os poderes constituídos
que perdura desde sempre.
Ademais, existem rumores não confirmados
de que o viajante adotou o guri e ganham muito dinheiro com consultas
esotéricas na capital do Pará.
(João Neto)
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